terça-feira, setembro 06, 2005


XIII

Ao afastar-me de casa, ao afastar-me do centro da aldeia, vislumbrei a casa da senhora Diana Tápu. Parei em frente à porta. Ouvi gritos que eram um misto de dor, ferocidade, e contentamento. Não ouvi a voz da senhora Tápu. Somente a voz do meu pai.

Fiquei muito tempo a ouvir aquele monologo de gritos estridentes. Muito tempo e muitos sons passaram pelo meu desenho imóvel. Estou a crescer, pensei.
Pensei mesmo que para um dia ser uma pessoa crescida teria que ouvir primeiro muitos daqueles sons. Como se não bastasse o tempo passar por mim. Não! Crescer é muito mais complicado que o passar do tempo! Para crescer tenho que fugir para longe. E sinto que tenho que ouvir aqueles sons outra vez! Mais de perto. Mais alto. Mais meus.

Afastei-me da porta quando o meu pai se aproximou da porta. Estávamos separados por uma parede como sempre estivemos toda a nossa vida. Mas desta vez o desenho estava mais intenso. A nossa vida estava mais intensa. Do outro lado da porta, o meu pai e um cheiro intenso a pessoas crescidas. No meio, a parede que sempre nos separou era agora visível e de tijolo sujo. Do meu lado, a porta a ficar cada vez mais longe, a casa a ficar mais longe, a aldeia a ficar mais longe. Tudo a ficar mais pequeno à medida que eu me afastava. E eu crescia.

Tudo me parece tão incrivelmente insignificante agora que estou longe.

O valor das coisas não está na sua real importância. Está na distância a que delas estamos.
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